sexta-feira, janeiro 24, 2014

Existe preconceito na Austrália? Existe sim. Só saber olhar.

Denise fez um post fantástico no blog dela sobre racismo e preconceito.

http://awaywego-rumoaaustralia.blogspot.com.au/2014/01/existe-preconceito-na-australia.html 

Os meus comentários seriam tantos que fiz um post enorme e cheio de links \o/
Eu me sinto do mesmíssimo jeito. Não é nada descarado, é talvez tão ou mais sutil que o Brasil, mas pra quem tem olho treinado não é difícil identificar.

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Das evoluções: ser gay, lésbica ou bi é completamente super aceito. Nível: um colega novato contaria que saiu no fim de semana com o namorado, você ouve de gente que acabou de conhecer que agora tem um marido - e antes uma namorada de muitos anos. Não ouvi uma piada homofóbica ou transfóbica. Mentira, um dia me falaram que "I'm lightweight, but not gay" e eu fiz questão de me fazer de desentendida até a pessoa ficar sem jeito da piada idiota rs.

Por outro lado, homossexuais não podem casar. Podem registrar união, e para algumas coisas é similar. 

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Por outro lado, ser feminista aqui é feio. E as feministas, eu pouquíssimo número, ao invés de tratar dos problemas internos, ficam fazendo passeatas pras meninas do Afeganistão. Me poupe.

Uma ampla pesquisa da Fundação Perseu Abramo de 2010 constatou que apenas uma em cada cinco brasileiras têm uma percepção negativa do feminismo. Imagine só, mesmo com toda a propaganda anti-feminista feita há décadas sem trégua! 31% das brasileiras se assumem feministas.
(da Lola)

Eu fico chocada com as feministas daqui. No Brasil somos um grupo cheio de cores, de todos tipos de mulheres, casadas, solteiras, trans, negras. Com seus problemas, com mais ou menos representatividade, somos várias, e diversas. E as marchas e eventos e basicamente toda organização
e muito horizontal, na melhor vibe de 'quanto mais melhor'.

Aqui, se você quiser participar de algo, você manda seu currículo. Pra voluntariado. Ploft ploft ploft.

Tem coisa que não entendo. Essa vibe de menino-é-só-amigo-de-menino. Se menina tá com um cara, é um 'date'. O cara tem que pagar primeiro encontro. TEM-QUE. A vantagem é que se o cara foi um saco durante o jantar, pelo menos você não pagou \o\

E o lance de quando casa (e se amigar aqui não é casar), pegar o sobrenome do marido? Gente, anos 50 mandaram oi! A maioria das mulheres param de trabalhar quando tem filhos, eu não sei o quão difícil é voltar para elas. Mas é bem bem bem mais raro ver pais que fazem o mesmo, embora no geral eles sejam muito mais mãos-na-massa que a média brasileira.

Já ouvi muita piada machista. Quando estou por perto, às vezes rola um pega por conta disso, ou mesmo outras pessoas mesmo falam que não é aceitável. Mas tem - bastante, mas menos que o Brasil. Por outro lado, tive duas situações de assédio chatíssimas no trabalho, e todas foram imediatamente levadas em consideração e medidas tomadas: e isso eu nunca esperei.

Aborto é normal, aceitável e tudo o mais. Porém não é direito. Simplesmente é feito porque é feito, mas um médico e uma mulher poderiam ser processados se o fizerem. 

Acho que a coisa é muito mais velada. Como disse minha amiga, você sai com decotão e os olhares não são de aprovação. Podem não falar bobagens, mas eles só se travestem de "respeitamos sua cultura", mas na verdade não é por aí - eles só não vão assumir na tua frente.
Existe uma entidade que eles creem de "tal pessoa não se adaptou a cultura australiana", "not a cultural fit". Em bom francês, BULLSHIT. Eles não querem lidar com o diferente.

Se você não acredita em nada disso, tivemos um painel esses tempos sobre gender cognitive bias, e foi muito bom. Fica aí os links dos slides e material.

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Sobre os refugiados, é terrível. Os relatos (e aqui outro) de quem trabalha com eles não dão conta de uma situação minimamente humanizada, com gente que sofreu todo tipo de trauma.

E continua.

Instead, a recent survey conducted by UMR Research found that 48 per cent of a nationally representative sample (weighted against census data) approve of the present treatment of asylum seekers, while 60 per cent think that the Government should increase the severity.
Bacana?


Em lugares com menos imigrantes, chegam a te perguntar o teu visto, se vc pode trabalhar. É líquido e claro que a maior parte dos australianos desaprovam as políticas de imigrante, embora ninguém vá realmente ser violento ou te xingar. A coisa é sutil, sutil.

E talvez isso explique porque eles não se misturam. Simplesmente chegam ao ponto de não entender sotaques externos. Acho que quanto mais escolarizado, melhor visão dos imigrantes os australianos tem.

Mas ainda me irrito quando um australiano me pergunta se pretendo voltar pra casa.

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Acho incrível como parece que eles conseguiram ser PIORES pros aborígenes que o Brasil para os índios. Parabéns a todos os envolvidos, até 1967 eles nem eram contados no censo como australianos. Leia também sobre "Stolen Generation", de ter um troço. E você pensa como se sentem as mães aborígenes de hoje. Descendentes de aborígenes basicamente não tem a menor condição de estudo, relatos de quem foi nas escolas deles e disse que simplesmente eles não tem professores, material ou mesmo um teto sem goteiras.

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Pra finalizar o post cheio de links, mais um. Putting the 'I' in idiot, Australians don't know what they want.

5 comentários:

  1. Opa, demorou pra sair um post nessa linha :P

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    1. Hehehe demorou mesmo. Mas como dizem, é só no segundo ano que a gente de fato chega.

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  2. Amo os aborígenes pela simplicidade e fé.

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  3. Curioso que eu não ouço muita piada machista não... Mas ouço muita mulher falando do seus "deveres" no lar, de que os maridos/namorados não ajudam em nada (já detesto isso de que o homem tem que "ajudar", parece que tá fazendo um favor!); por outro lado vejo por aqui muito mais pais cuidando sozinhos das crianças, inclusive bebês.
    Ah, e não sabia da história do aborto. O que eu sempre ouvi é que qualquer mulher faz um aborto aqui, basta dizer que não tem condições psicológicas de levar a gravidez adiante.

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    1. Talvez IT seja mais machista, ou os piá se sentem mais a vontade pra falar.

      Sobre aborto, o que eu li é parecido com o que vc fala:
      "Abortion law in New South Wales is primarily based upon the Levine ruling of 1971 (itself derived from the Victorian Menhennitt ruling of 1969), which declared abortion to be legal if a doctor found 'any economic, social or medical ground or reason' that an abortion was required to avoid a 'serious danger to the pregnant woman's life or to her physical or mental health' at any point during pregnancy. This was expanded extended the period during which health concerns might be considered from the duration of pregnancy to any period during the woman's life. This arguably precludes any successful prosecutions for illegal abortions. Despite this, in 2006, a doctor, Suman Sood, was convicted of two counts of performing an illegal abortion where she failed to enquire as to whether a lawful reason for performing the abortion did exist"

      O lance é que hoje, uma mulher pode alegar que não tem condições psicológicas e os médicos fingem que tá tudo certo. Só que não existe direito legal de fazer aborto por escolha, o médico/governo que decidiria se você tem esse direito (e isso pode ser mudado por qualquer diretriz ou lei). É o jeitinho, sabe? Nada garante que em 10, 15 anos vc não teria que passar por 3 psicólogos antes de ter um diagnóstico.
      E teve a Zoe Law esses tempos, pra contar um feto de 20+ semanas como uma pessoa. Vai vendo.

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